“Você, cidadão, é o responsável pelo Caos Judicial”! 28574l
Por Redação / Agora no Vale Publicado 06/12/2019
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Leia a coluna desta semana advogado Luis Paulo Tonini
Embora o título deste artigo
tenha como intenção lhe provocar para a leitura do texto, acredite, alguns
realmente afirmam que somos nós os responsáveis pelo grande número de demandas
judiciais e o atual caos judicial. Será?
O caso da Justiça Brasileira é complicado:
sobram processos; faltam servidores, juízes e estrutura para julgá-los. A
afirmação é antiga, e os números vem piorando: o judiciário está cada vez mais
“abarrotado” de processos.
É neste cenário que alguns
afirmam ao cidadão comum que este deve buscar resolver os seus conflitos fora
do judiciário ou abrir mão de parte de seus direitos para que consiga um acordo
e a demanda não se arraste por anos. Contudo, embora muitos discordem de mim,
tenho que dizer: cidadão, busque seus direitos e não deixe que lhe afirmem o
contrário!
Você sabe contra quem a grande
maioria dos processos é direcionada? Estudo do CNJ apontou que bancos,
operadoras de telefonia, órgãos de previdência como o INSS e órgãos municipais
e estaduais são aqueles que mais possuem processos questionando suas decisões e
ações em relação ao cidadão.
Não precisamos ir longe para
compreender esta realidade. No Município de Lajeado/RS, somente nos últimos
anos, nossa concessionária de água foi alvo de centenas de processos judiciais
em razão de falhas no abastecimento e outros problemas relacionados. Municípios
da região, por sua vez, também acumulam centenas de processos onde o judiciário
reconhece ilegalidades das mais diversas, deste cobranças ilegais de tributos
até a não atenção à direitos relacionados à saúde e educação. E, é claro, não
podemos esquecer do INSS, que nega indevidamente benefícios como auxílios
doenças e aposentadorias para a população todos os dias.
E as empresas de telefonia? E os
bancos? E as seguradoras? Não é culpa do cidadão comum que o judiciário está
cheio de processos. Não se pode culpar a vítima de um abuso de direito pelo
processo que busca reconhecer a arbitrariedade! Deve-se, por outro lado,
questionar o real motivo pelo qual tais órgãos e empresas, mesmo com o grande
número de processos, insiste em lesar o cidadão. Você arriscaria dizer qual é?
Creio eu que o motivo é simples:
na ponta do lápis, quando se analisa o número de pessoas lesadas e quantas
realmente buscaram seus direitos, percebe-se que a grande maioria não reclama
pelo que lhe é devido, e é mais vantajoso para empresas, bancos e órgãos
públicos continuar lesando o cidadão, mesmo arcando com o pagamento daqueles
poucos que buscaram seus direitos.
Creio eu que este seja um dos
grandes motivos para que nós, cidadãos, sejamos tão lesados com cobranças
abusivas de tributos, abastecimento de água e serviços de telefonia precários e
não recebemos os resultados de anos de trabalho duro como deveríamos. Por
óbvio, transferir para o cidadão comum a culpa por buscar a justiça dá
resultado: a grande maioria não cobra do transgressor a devida reparação e os verdadeiros
culpados continuam a desrespeitarem os direitos de todos, pois é mais vantajoso
lesar o coletivo e indenizar os poucos que buscam a justiça. E não se engane, o
judiciário raramente julga alguma ação procedente sem que algum direito
realmente tenha sido lesado. “Espertinhos” não têm lugar no judiciário.
Certamente você conhece alguém
que teve de buscar a justiça para se aposentar. A estimativa é de que o INSS
responda há cerca de 1,6 milhão de processos judiciais por ano! Embora não
possa se falar que todos esses processos sejam vencidos pelos contribuintes,
sabemos que a grande maioria deles de fato é!
Leitor, pense em quantos
desrespeitos a direitos sofremos nestes últimos tempos! São os serviços de
telefonia que não funcionam corretamente quando precisamos utilizar e as
dezenas de ligações feitas por centrais telefônicas automáticas que atrapalham
nosso dia a dia. É chegar em casa no final do expediente de trabalho e perceber
que não há água sequer para tomar banho. É buscar um atendimento médico, exame
ou cirurgia e receber como resposta que não há previsão para a realização. É
ter sua residência ou veículo sinistrado e receber a negativa de cobertura da
seguradora. É descobrir que depois de muito sacrifício e trabalho duro, você
enfrentará um processo de anos para garantir seu direito à aposentadoria, e
enquanto o processo tramita por anos, você precisa seguir trabalhando, às vezes
doente. Exemplos não faltam, a lista seria gigantesca.
Assim, não consigo pactuar com o
pensamento de que é o cidadão comum que dá causa ao problema judicial. Creio
que podemos tentar resolver questões istrativamente, mas, infelizmente, na
maioria das vezes nosso direito somente é reconhecido pelo judiciário.
Melhor seria se nenhum litígio
fosse instaurado nesse País, mas da forma como a situação está, não consigo deixar
outra mensagem ao leitor além do incentivo à buscar os seus direitos e, sempre
que se sentir lesado, consultar um advogado de confiança para esclarecimentos.
Quem sabe um dia seja mais
vantajoso à grandes empresas e órgãos estatais respeitar nossos direitos do que
desrespeitá-los, e então tenhamos uma vida mais digna e justa. Por hora,
seguimos na luta.